sábado, 11 de dezembro de 2010

7. Imagens Suspeitas

O Dr. D. Costa considerou que eu e a minha última mamografia devíamos ser vistos pelo seu colega mastologista, o Dr. José Vaz. Perguntei se desconfiava de algo novo, mas ele respondeu apenas: - É sempre melhor ser avaliado pelos melhores. Combinámos um encontro na Urgência do hospital, para depois ele me levar até ao Dr. José Vaz, me apresentar e me deixar com ele. O Dr. José já falara com o seu colega. Todavia, fez-me algumas perguntas de rotina sobre a evolução dos meus nódulos, viu a minha última mamografia e outras que levei, fez-me a palpação, mostrou-se preocupado por haver um nódulo visível nos exames mas não palpável, e marcou, sem me perguntar se eu podia comparecer, uma biópsia para daí a dois dias, às 21 horas, no hospital. Regressei a casa sem muitos pensamentos, considerando mais o transtorno de ficar sem o serão que antecedia o início das reuniões de avaliação do primeiro período. Para as minhas mãos, nenhum dos nódulos alguma vez fora palpável. Eu ia sabendo deles pelas mamografias e ecografias mamárias e já tinha conhecimento de que havia desconfiança de um fibroadenoma. Contudo, até então, sempre me disseram que o que havia a fazer era controlar, o que eu sempre fiz, naturalmente.
Dois dias depois, lá estava eu, à noite, à espera de ser picada na mama. Intercaladamente com o pessoal da Urgência, iam entrando senhoras para o mesmo que eu e ouviam-se sempre os seus ais e os seus gemidos. Numa das aparições do Dr. Carlos no corredor, perguntei-lhe se ia doer e ele respondeu-me docemente:
- Claro que não, minha querida, comigo está nas mãos de um anjo.
Continuei em pé, encostada à parede, até se perfazerem duas horas de espera. Pensava que devia ter levado comigo o trabalho da escola. Ainda não tinha as grelhas todas preenchidas para a primeira reunião, às 9 horas do dia seguinte. Sentia o cansaço tomar conta de mim e ainda havia tanto a fazer antes de poder ir dormir.
O Dr. Carlos alinhou as minhas mamografias no painel da contraluz, não conseguiu disfarçar uma expressão de quem deparou com algo que preferia não ver e, em silêncio, comparou tantas vezes os meus registos que eu, não conseguindo decidir se falava ou não, experimentei, sem palavras de ninguém, a primeira sensação de medo (mas logo quase uma certeza) que houvesse algo maligno dentro de mim. Quebrou ele o silêncio, começando a fazer-me perguntas, de uma forma delicada, mas que também senti estar a demorar uma eternidade. À medida que ia respondendo, ia aumentando o meu estado de impaciência, pois o que eu queria era perguntar. E, quando o fiz, obtive:
- Tem um nódulo que é visível nos exames mas não se consegue palpar e parece ter mudado de aspecto desde o último exame. Vamos tentar chegar a esse na biópsia. Já alguma fez isto? - E eu respondei que não, apenas uma punção. Então ele mostrou-me uma espécie de pistola e a agulha (grossa) que iria usar, acrescentando que, em três ou quatro disparos, ele deveria conseguir recolher uma quantidade suficiente de tecido para enviar para o laboratório de anatomia patológica.
Os disparos foram cinco. Entre eles, falávamos de futebol (assunto que eu nunca abordo), como se cada disparo fosse um golo e o pequeno interregno que fizemos, para eu descansar um pouco, fosse o intervalo entre os dois tempos de um jogo - numa perspectiva de contagem decrescente do tempo até ao fim da biópsia. Confesso que foi uma boa estratégia a do Dr. Carlos. Se aquela primeira pequena grande invasão à minha mama direita tivesse acontecido nas mãos de um médico silencioso (como conheço tantos), a dor ter-me-ia logo atingido a alma; assim, ficou, por essa altura, apenas pelo corpo.
No fim, recebi uma festa do Dr. Carlos e os parabéns por me ter portado bem, acompanhados de uma exclamação:
- Eu não lhe disse que ia estar nas mãos de um anjo!?
Interroguei-me se ele não teria sido anjo para as senhoras que se ouviam gemer de dor lá fora ou se seria eu que conseguia sofrer em silêncio e elas não. E inclinei-me para a segunda hipótese. Pareceu-me, aliás, logo ali, que eu só podia ser optimista, ter pensamentos positivos. Mas, pouco depois, chegaria o segundo embate. Já passava das onze e meia, quando o médico me disse que ia tratar de uns contactos, nomeadamente de um telefonema para o Dr. José. Estranhei aquele procedimento a uma hora daquelas, mas pus a hipótese de o colega estar de serviço e, por isso, aquele telefonema não ir incomodá-lo no seu repouso.
- Pode cá estar amanhã às nove? - perguntou-me após os contactos.
- Da noite? - experimentei, por comparação com a hora marcada para o exame que acabara de fazer.
- Não, da manhã. O Dr. José vai cá estar e eu quero que a veja.
- Mas amanhã às nove eu tenho uma reunião de avaliação.
- Então e não pode mesmo? Veja lá isso. Comunique com quem precisar. Eu vou arrumar os seus exames, escrever uma carta ao Dr. José... Sabe, os dias a passarem... nestes casos...
Devo ter ficado branca, mas não tenho mais testemunhas para além dele. Tinha ido sozinha.
Dali do corredor do hospital, enquanto um médico, pretensamente, arrumava a minha tralha e escrevia uma carta sobre mim a um colega, eu liguei à Madalena e disse-lhe que quando chegasse a casa enviaria por email a documentação para a reunião das nove, documentação que eu ainda não tinha pronta, pois tinha contado com aquele serão para concluir o meu trabalho. Em casa, o Pedro arranjou-me uma ceia enquanto eu lhe contava a minha experiência, da qual tive uma recordação visível (um grande hematoma) até ao último dia de vida da minha mama.
Ter o Pedro para me ouvir e mimar produziu o habitual efeito calmante, e eu tratei dos meus afazeres até ao envio de tudo por email.
Estávamos a dezassete de Dezembro. Eu ainda não sabia, mas não voltei a trabalhar na escola durante um longo período.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

6. O Centro de Formação "Trevo de Quatro"

Num almoço de sábado, combinámos uma estratégia familiar para conseguirmos ter sempre dinheiro para passarmos as férias do Verão num local com praia e piscina. Deixaríamos de ter empregada doméstica e criaríamos o imaginário de pertencer a um centro de formação no qual os quatro filhos funcionariam como formandos e os pais como formadores, com vista à qualificação de todos para a pertença à equipa de seis que havia de ter sempre garantida a execução de todas as tarefas domésticas. Fariam parte do currículo de estudos várias acções e oficinas de formação, após as quais, se terminadas com êxito, os pais entregariam certificados onde estariam registados os créditos adquiridos. Os certificados de cada um seriam arquivados em dossiês individuais e os créditos serviriam para trocar por eventuais castigos merecidos por faltas de pouca ou média gravidade.
A ideia estava a agradar a todos e houve quem referisse que, assim, talvez o dinheiro até desse para fazermos mini-férias de vez em quando, por ocasião de feriados e pontes, por exemplo.
Por esta altura, a Maria tinha doze anos, o Quico tinha dez, e o Miguel e o Tiago tinham oito. E sentir a minha filharada pequena entusiasmada com a ideia de realizar trabalhos domésticos foi surpreendente e agradável. Pensámos então num nome para o nosso "Centro de Formação" e após muitas hipóteses a provocarem risota quase até ao disparate, houve consenso quanto a 'Trevo de Quatro' - a "escola" em que os quatro manos se formariam para serem excelentes donos de casa, o que viria a ser uma mais-valia para todos, quer no futuro próximo, quer num mais remoto. O nosso genro e as nossas noras, a existirem, não haviam de vir um dia pregar contra a educação ministrada aos seus companheiros pelos progenitores. Combinámos preferir oficinas a acções de formação, pelo que os créditos só eram atribuídos após a execução das tarefas individualmente ou em grupo, sem a ajuda dos pais. Tal aconteceria num segundo momento das oficinas, a realizar na semana seguinte à de cada sessão de transmissão de conhecimentos teórico-práticos.
As três primeiras oficinas receberam as seguintes designações: Perfeição na Limpeza do WC; A Arte de Dobrar T-shitrs em Poucos Segundos; e Introdução à Preparação de Uma Sopa.
No dia da limpeza do wc, tocaram à campainha por duas vezes. Da primeira vez era a Ritinha, de nove anos, vizinha da casa "granitada", que vinha pronta para a brincadeira após o almoço. E lá fui eu à porta para lhe explicar que entrar podia, mas não era para brincar. Se quisesse, ficava a assistir à exposição de todos os cuidados a ter, de todo o material necessário e de todos os procedimentos devidos a uma limpeza bem feita numa casa de banho. Eu e o Pedro já estávamos a começar a explicar e os seus amigos iriam ouvir e experimentar. A Ritinha disse que tinha de ir perguntar à mãe se podia ficar. E, enquanto foi e veio, eu só tive tempo de fechar a porta e subir as escadas. Logo tocou o Rafael à campainha. Agora era um dos manos da casa em frente, já com a bola nos pés, pronto para a jogatana no relvado. E já lá vinha a Rita, a dizer, pela rua fora, que ficava a ver a limpeza. Ao perceber que a Ritinha fora pedir à mãe, o Rafael considerou que devia fazer o mesmo. E assim ficaram as minhas vizinhas mães a saber que ia passar-se em minha casa um acontecimento extraordinário.
Formandos e formadores estiveram sempre dentro da casa de banho, enquanto a Ritinha e o Rafael assistiam do lado de fora. Nenhum deles tinha obrigações domésticas para além de fazer a cama, levar o lixo para os contentores e pouco mais. Mas, no tempo que ali passaram, até lhes pareceu divertido o trabalho e souberam responder a algumas perguntas no final. Os nossos conseguiram logo discutir na distribuição dos sanitários a limpar, mas tudo acabou em bem.
Na semana seguinte, depois de terem prestado provas em conjunto, demos a cada um dos filhos um certificado que atestava a aprovação na oficina e a aquisição de dois créditos. Aos vizinhos, oferecemos um atestado com um crédito, confirmando as suas presenças, algo que à mãe da Ritinha pareceu uma iniciativa interessante, mas à mãe do Rafael eu nunca soube se provocou alguma reacção.
A minha ideia estava a ter bom acolhimento por parte de quem me interessava, o que me entusiasmou para continuar, para contar às minhas colegas da escola o que andava a experimentar com os filhos e para dispensar a empregada doméstica. E, num belo dia, eu e o Pedro fizemos o quadro de registos do Campeonato de Arrumação dos Quartos. Estávamos a acabar 2007 e já conseguíamos controlar a miudagem, de modo a mantermos a casa arrumada e limpa.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

(Ei, hoje sirvo um Irish Coffee. Aparece!)

5. Potenciais Problemas para a Saúde

Por essa altura, já eu andava há mais de um ano a fazer mamografias com regularidade, pois em cada nova que fazia apareciam mais nódulos na minha mama direita e os que já lá estavam anteriormente revelavam ter aumentado de tamanho. E até já tinha feito uma punção, com uma agulha fininha, para retirar tecido para ser analisado. Os médicos estavam atentos, mas diziam que o aspecto apontava para algo benigno. E o resultado da punção não foi diferente. Eu andava naturalmente preocupada e falava nisso às pessoas com quem me dava, mas confiava nos médicos e acreditava não haver qualquer problema para a minha saúde por esses corpos estranhos ao organismo estarem dentro da minha mama. Mais preocupada estava a minha mãe, talvez por ser a minha mãe e por a ela, trinta e tal anos antes, terem retirado alguns nódulos da mama esquerda. Eu não ligava muito ao caso da minha mãe, pois tinha sido um caso de retirada de tumores benignos e ela nunca mais tivera nada estranho na mama. Contudo, outras pessoas mostravam-se sempre interessadas na evolução dos meus nódulos. Uma dessas pessoas era a Rute, que chegou a ligar-me para saber como ia a minha mama e esteve à conversa comigo sobre isso e sobre outros assuntos durante mais de uma hora, tendo, curiosamente, rodeado a questão que eu andava a querer debater com ela, e a questão ficou, de facto, sem ser debatida.
Na escola, algumas das minhas colegas começaram a preocupar-se consigo próprias, pois, não tendo mamografias recentes, punham todas as hipóteses. Percebi que o que se passava comigo provocava algum medo nas mulheres, mas eu não estava amedrontada. Não pensava muito no caso e julgo que não pensava em cancro, por crer que, mais dia, menos dia, me aconteceria o que aconteceu à minha mãe, sem mais. Até a Madalena tirara um nódulo aos quinze anos e outro uns anos mais tarde. Tudo benigno. E ser operada para tirar os nódulos não era coisa que me atrapalhasse, talvez especialmente por saber que a minha mãe o tinha feito e por reconhecer nela muita força em questões de intervenções médico-cirúrgicas. Se a minha mãe enfrentava esses problemas com toda a garra, não havia de ser eu que me ia revelar uma medricas ou uma fraquejota! Portanto, eu aguardava serenamente a evolução, embora saiba que lá muito no fundo, sem consciência absoluta, até porque nunca o verbalizei (eu, que sou uma "verbalizadora" compulsiva...) morava alguma apreensão. Mas a vida continuava, naturalmente stressante e deliciosa, quer no que dizia respeito à profissão, quer no que tocava à família.
Na escola, destacavam-se, pela negativa, os conselhos pedagógicos, que, quase invariavelmente, se iniciavam às cinco da tarde e terminavam pelas onze da noite, sem qualquer intervalo. Eram reuniões massacrantes pela sua duração e pela consciência de que muitos dos envolvidos gostavam era de se ouvirem a si próprios e, por isso, o sumo desses encontros, arrastados e pouco agradáveis, era quase nenhum. E havia também a desagradabilíssima presença de um dos representantes da Associação de Pais, que nunca deixou de estar contra os professores, fossem quais fossem as suas ideias. Parecia que estava mandatado para contrariar e contradizer e apostava sempre em nos lançar um interrogatório cerrado, que, apesar de não amedrontar ninguém (até porque cão que ladra não morde!), moía-nos a todos, arrasava-nos as poucas forças que ainda tínhamos, após um dia que começara às nove da manhã e já estava a entrar pela noite. Depois de aturarmos os filhos, acto contínuo (depois do lanche) aturávamos os seus pais, na pessoa daquele indivíduo, que só pode ser um frustrado, para pegar em tanto pormenor sem importância para o bom funcionamento da escola e, muitas vezes, carecendo de carácter pedagógico, sem nunca a sua intervenção ser travada pelo presidente, o qual até deitava mais achas para a fogueira.
Em dias de conselho pedagógico, quando eu chegava a casa, o Pedro fazia-me companhia na cozinha e eu jantava o que conseguia comer, que era sempre pouco, devido ao stresse, apesar de me encontrar esfomeada. Muitas vezes, doía-me o estômago e outras tantas contava o meu dia ao Pedro lavada em lágrimas de stresse. Felizmente o tinha ali, para relativizar tudo aquilo que me parecia uma grande chatice e para me abraçar, aquecendo-me a alma. Eu sentia, seriamente, que, sem o Pedro, não aguentaria a vida que estava acontecer-me. Porque ela estava mesmo a acontecer-me. Eu nem sequer tinha querido ser coordenadora de departamento. Fora eleita e tivera de aceitar.
E os meus amigos de Lisboa pareciam-me cada vez mais longe, relacionalmente falando. Tanto assim que houve um outro episódio por causa de emails, quando eu decidi enviar a todos os meus contactos um pedido, escrito em tom de brincadeira, para não me enviarem emails em massa. Estava tão cansada de os receber e de ter de os deitar fora que resolvi manifestar a minha opinião a toda a gente, acreditando, ingenuamente, que achariam piada à linguagem e que fixariam que eu não gostava daquilo e não me enviariam mais do mesmo.
Intitulei-o Email Para a Malta Minha Amiga (Boas Festas e assim...) e escrevi:
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Malta
Vocês são todos uns bacanos, baris, fixões (Atenção: Estou de férias... posso usar calão! Mas não dou erros ortográficos, nem de construção!!!...), gramo bué de vocês todos, mas tenho de esclarecer aqui uma cena...
É assim: Mails desses de "Vou ficar à espera, a ver se me me devolves", "Se não enviares a 1473 pessoas nos próximos minutos, tás f...e se enviares serás feliz para sempre ou então vai realizar-se esse desejozinho secreto que mora aí e não contas a ninguém..." só me dão vontade de vos esganar !!!
Pronto. Já disse.
É que um gajo (ou gaja, que sou eu) tem direito a melhorzinho. Tenho a caixa de e-mail permanentemente com + de 100 mails por ler...
Ora, convenhamos, malta amiga... Mandem algo que não me exija nada! Assim coisa tipo prenda que é para mim mesmo e não para vos devolver nem para partilhar com o resto do mundo!!!
Claro que há coisas indiscutivelmente meritórias da divulgação à Humanidade, mas deixem-me ser eu a decidir!!! Adoro decidir! ADORO DECIDIR!
Portanto... não sejam uns cabronaços exigentes! Sejam antes uns mãos largas selectivos!!! Perceberam?! Selectivos! Atrevam-se a conhecer os outros e a saber do que gostará este e do que gostará aquele...
Ai dá trabalho dá!!! Mas é cá um gozo ter a certeza que este gosta de Mon Cherry e para o outro já tem de ser Ferrero... E que o terceiro é igualmente amado por nós, mas odeia chocolate, coisa pela qual nós até daríamos a vida...
Pois é! Um conhezinho de diferenciação na apreciação dos nossos mais queridos é das coisas mais inteligentes que podemos tentar concretizar na vida!
Eu vou esforçar-me por vos perceber a todos. Sei que se calhar já vos enviei muita treta, mas quero redimir-me. Digam de vossa justiça aquilo que gramam e não gramam.
Sejamos sinceros, francos, sem medo de magoar, porque desde que a intenção não seja mesmo magoar... tudo é válido! Menos tirar olhos, como já todos sabem!
P.S. Se recebeste esta mensagem é porque gramo buereré de ti, mas não precisas de ma devolver nem de a enviar em poucos minutos ao mundo inteiro!
Tchau. Goza as férias à maneira, curte bem a Páscoa e os bacanos da tua família.
2º P.S. Mesmo que não devesse tratar-te por TU, cá vai porque é sinal que és barilóide!
3º P.S. Agora que estás a ler isto, já esta converseta toda chegou às caixas de muitos outros chavalos e chavalecas também importantes para mim. Mas tu não sabes quem são porque eu envio isto sem te deixar saber. Hi! Hi! Podias fazer o mesmo...
4º P.S. Depois disto tudo, ficas a saber que eu também sou uma porreiraça - se for caso disso, quando é caso para isso, com quem merece isso...(Ou seja, escusas de começar a imaginar!...)
Mas isso não significa que admito qualquer coisa... A começar por emails em cadeia e com ameaças ou promessas... e a acabar em emails em cadeia e com ameaças ou promessas!!!
Ah... e-mails de aflição com caras de putos perdidos e assim também morrem logo aqui...
Pensem o que quiserem!
Há muitas maneiras no mundo para se fazerem as coisas bem feitas! Não é preciso ir sempre por um caminho qualquer, o primeiro que aparece, o mais fácil, o que está mais à mão!
E mais: é fixe considerar que contigo posso usar a palavra 'fixe', assim... "off the record"...
Margarida Faro
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(Eu estava a sério e a brincar, ao mesmo tempo, acto mais do que comum na vida do clã dos meus amigos...)
Dessa vez, aconteceram três reacções , uma positiva, uma neutra (a de quem não respondeu) e outra negativa. A negativa foi do PedrO e rezava assim:
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Cara amiga:

A vida no campo possibilita, na verdade, bons horários... e muito tempo livre..

Não percebo como é que tens tempo e pachorra para dares importância a coisas completamente irrelevantes e perfeitamente inofensivas.

Estou sempre a receber todo o tipo de mensagens, mais ou menos interessantes, mais ou menos engraçadas, mais ou menos bimbas, etc etc, mas nunca me passaria pela cabeça estar a dar importância a coisas que simplesmente não têm qq tipo de importância ou relevância. E correr ainda o risco de com respostas, essas sim um pouco, diria, desagradáveis no mínimo, deixares, provavelmente de as voltar a receber. Mas, ...essas e provavelmente quaiquer outras......

Apetece dizer, Guida, Guida, sou eu, somos nós, lembras-te?! Estamos a brincar, a gozar, a ironizar o próprio conteúdo da mensagem.. Percebes? Descontrai, ri-te um bocadinho..não sejas tão insegura. Não queiras ser a medida para o tipo de humor (mais ou menos selectivo) dos outros. Guida, não compliques...

Bjs e Boa Páscoa

PS: Espero que pelo facto de ter escrito Bjs e não Beijinhos, não fiques a pensar que o que eu realmente queria era ter o menos trabalho possível e não escrever a palavra toda, ou que o que eu no fundo penso é que tu não mereces beijinhos com estas letras todas, mas apenas com três, ou ainda que beijinhos com três letras não têm o mesmo valor que beijinhos com nove letras, ou ainda que beijinhos com três letras são pouco selectivos e dão-se a qq um ou uma, e que portanto não há direito para tratar os amigos assim, etc., etc., ...

Guida, descontrai...

E já agora , BEIJINHOS e Boa Páscoa

(e boa sorte para a Maria)

PedrO

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A primeira frase do PedrO podia ter-me dado para rir, mas, apesar de eu continuar a alimentar a contenda, já estava a ficar cansada dela e pareceu-me que ele começava com uma ironia de um tipo corrosivo, a qual eu não reconhecia nas minhas palavras. E em toda a mensagem ele simplesmente gozava comigo, não chegando nunca ao cerne da questão...

Eu andava cansada, stressada e desanimada com a crescente onda de reacções contra o que eu escrevia. Mas isso talvez me desse para escrever cada vez mais dura e apaixonadamente, pois essa escrita era, para mim, libertadora de tensões. O problema era que ela libertava umas, mas provocava outras! E entrámos num ciclo vicioso, que envolveu vários emails e vários telefonemas, até serenarmos um pouco.

4. Intercorrências da Comunicação - II

Já no Verão eu tinha experimentado uma sensação estranhamente acre ao tentar partilhar com a Rute uma deceção enorme que me havia acontecido em contexto familiar, na linha ascendente. Como de costume havia uns anos, estávamos a gozar, no mesmo aldeamento, os quinze dias de férias familiares com praia e piscina, no sul do país. A Rute conhecia a minha família e sempre fora, para mim, uma confidente com quem eu partilhava as maiores alegrias e as maiores tristezas. Dessa vez, era um sabor demasiado amargo o que vivia em mim desde finais do ano anterior, mas eu não encontrara ainda tempo nem espaço para o divulgar fora das portas do meu núcleo, onde ele pudesse ser debatido e a minha mágoa aliviada. E o que é certo é que os quinze dias não foram suficientes para que eu me aliviasse dum peso que estava a fazer-me olhar para o mundo com olhos que nunca haviam sido os meus - os olhos da descrença, da desconfiança.
Sentia-me traída por um membro da família que me era muito próximo. E essa "traição", do tamanho da minha vida inteira, estava a afastar-me ainda mais de pessoas a quem eu já antes retirara o meu selo de amizade incondicional. Naquele momento, já nenhuma relação era, para mim, incondicional. Com uma já eu tinha acabado e que mal me sentia por isso, mas voltar ao que ela antes fora era para mim impensável. E a Rute ainda não sabia de nada, nem do meu sofrimento nem da mudança na minha visão do mundo, que se seguiu à revelação e se afirmava cada vez mais segura à medida que o tempo ia passando. O mundo inteiro desabou no dia em que eu soube de uma vez só aquilo que devia ter ido sabendo ao longo de muitos anos, como prova de verdade na relação, na amizade. E, com o mundo, desabou também o débil conceito de família que eu tinha, se alguma vez o tivera. Curiosamente, depois de conseguir revelar à Rute apenas o teor do meu tormento, a própria Rute passou a parecer-me um ser inacessível, que nunca mais arranjava tempo para debatermos o assunto que eu apenas lhe havia soprado. Apesar dos meus sucessivos sinais para que ela conseguisse um momento para conversar comigo, a partir daí surgiram sempre obstáculos, de tipo variado, à minha vontade de lhe revelar tudo e de colher a sua opinião. Estranhei a recorrente falta de disponibilidade da minha amiga, até que comecei a acreditar que já não havia hipótese, pois surgiram indícios de que era ela que não tinha vontade de abordar o assunto ou então não lhe apetecia conversar comigo. Fixei-me na primeira hipótese, também baseada em indícios de que ela não iria concordar comigo e, por isso, se andava a esquivar de me ouvir. Até alguns telefonemas que lhe consegui fazer foram abruptamente interrompidos por causa da chegada de alguém ou de telefonemas de outras pessoas. E nunca a nossa conversa era retomada.
A minha autoestima, que nunca estivera em alta, baixava agora consideravelmente, pois, a par da indignação que sentira por ter sido enganada (por omissão de factos relevantes para a construção da imagem que eu tinha da pessoa em causa), eu via-me agora como alguém que não havia sido considerado merecedor do conhecimento daquilo que me fora ocultado. E com a Rute estava a passar-se algo do género, pois, se ela tivesse por mim a consideração que eu imaginava, não lhe havia de ser difícil encontrar uma maneira de conversarmos sem sermos interrompidas. E se ela nem a sms respondia... Foi crescendo em mim uma incapacidade para voltar a tentar o que já podia aborrecer e nem me atrevi a tentar a Teresa, com quem já tinha acontecido o desaguisado a respeito dos emails, e tendo eu dela a ideia de que era pessoa de poucas palavras e nenhuns desenvolvimentos.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

3. Intercorrências da Comunicação - I

Foram muitos os meses que constituíram os meus tempos iniciais na blogosfera, meses em que esperava reacções de pessoas que, na sua maioria não tinham blogues. Da escola, havia algumas colegas que os haviam criado na mesma acção onde eu descobri o gozo desse mundo novo, para mim, mas poucas estavam motivadas para os alimentarem ou mesmo para visitarem os das amigas. Quem aparecia, por vezes, no Canto do Ego, mais com o intuito de me deixar beijinhos do que o de comentar, era a Sara, que, no blogue dela, gostava de postar fotografias das suas passeatas, mas espaçadamente no tempo. Para além dela, só a Rosa e a Judite se entusiasmaram ligeiramente com o acto de publicar, ambas em blogues relacionados com as temáticas por si lecionadas, mas por pouco tempo e sem sentirem falta de interação por não colherem apreciações de visitantes.
Pelo meu lado, cada vez mais sedenta de comunicação com a minha malta de Lisboa e de registo escrito das minhas opiniões sobre o que nos rodeia, o que somos e o que nos obrigam a ser, comecei a revelar-me crítica num suporte já mais utilizado por todos, o email.
Em 2007, vivia-se uma verdadeira paixão por emails em massa, com anedotas, pequenos vídeos, apresentações de powerpoint... A maior parte das pessoas não se dava sequer ao trabalho de formar opinião sobre aquilo que recebia, pelo que, porque estava na moda, tudo o que era recebido era encaminhado para outros. As caixas de correio electrónico estavam quase sempre cheias de mensagens que só faziam perder tempo, a maior parte delas carregadas de erros de português e muitas com a indicação final de que se não enviássemos aquela maravilha para dez, vinte, cinquenta pessoas, algo de muito mau nos aconteceria ou então, se o fizéssemos, algo de espantosamente bom nos seria oferecido. Para além disso, eu via os endereços de todos nós a ocuparem dez centímetros do espaço inicial do email, o que queria dizer que (quase) ninguém se preocupava em não revelar ao mundo o seu próprio endereço, uma vez que, ao encaminhar todos os que lhe chegavam (pois essa acção não exigia perda de mais tempo a limpar o excedente), se revelava conivente com uma realidade que facilitava a transmissão de vírus informáticos através de anexos de emails.
Ora, eu, com um espírito naturalmente atento e crítico, comecei por enviar um email pessoal a todos os meus contactos particulares, explicando como fazer para não divulgar entidades alheias, até porque muitas delas podiam preferir não ficar à mercê de qualquer cibernauta com gosto para a pirataria. Mas contam-se pelos dedos de uma mão aqueles que me responderam e começaram a eliminar os contactos que não deviam ser reenviados. E um belo dia, já mais do que farta de pretensas ameaças a pairarem sobre a minha cabeça, pois eu não reenviava quase nada, reagi a uma mensagem que me incitava ao reenvio "quer eu acreditasse quer não" no seu conteúdo. A primeira a conhecer deste modo a minha opinião sobre correntes de emails foi a Teresa, a quem enviei o seguinte:
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Olá, Teresa!
Por que razão hei-de reenviar uma "mensagem" quer acredite no seu conteúdo quer não?! "Correntes"?! Já no tempo em que nos deixavam este tipo de tretas na caixa do correio normal, muitas vezes manuscritas (o trabalho a que muita gente se dá!), eu simplesmente as 'enviava' para o LIXO!!!
Desculpa lá a sinceridade, Teresa. Eu penso no que faço. Não faço só porque sim nem porque me pedem - sem me explicarem a razão.
"Acredites ou não..."?!!! Então o que é que andamos a fazer neste mundo?! Vou transmitir aos outros algo em que não acredito?!...
Bem, não é para ficares chateada, obviamente (!), mas ficas a saber que este tipo de mensagem não é para mim! PONTO FINAL!
Beijos a todos
P.S. Importante:
1. Desculpa a dureza da linguagem. Acho que estás a "levar por tabela", depois de eu já ter recebido N destas porcarias!
2. Gosto imenso de receber emails. Não te inibas de me enviar outro tipo de coisas.
Guida
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Esta missiva constituiu resposta a um email que não pedia resposta (era apenas para reenviar...) e cujo título era 'Olho de Deus', o qual, supostamente, estava visível numa apresentação de Powerpoint. E o título que eu atribuí à resposta, que seria recebida pela minha amiga de sempre, com quem, oralmente, já trocara tantas palavras de nível abaixo do familiar..., foi: 'Olho de Deus, olho do cu, olho de quê'?!...
No mesmo dia, recebi a resposta da Teresa:
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Vou-me encher de paciência para te responder...
Sempre me questionei sobre a paciência que consegues arranjar para te abespinhares com coisas sem importância nenhuma... Eu, ao contrário de ti, nem sempre penso no que faço, quando o que está em causa é uma brincadeira inócua ou algo sem quaisquer consequências. Neste caso, a brincadeira é a saloiada da msgm (que posso sempre lembrar, se me acontecer algo de bom ainda hoje... - continuo à espera, mas ainda nada...)
bjs
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Fiquei apreensiva com esta resposta. No meu entender, eu tinha escrito como quem fala e sentia que, se tivesse 'dito' tudo o que escrevi, a reacção teria sido completamente diferente, para muito melhor. Pareceu-me haver ali um problema gerado pelas características da linguagem escrita. A falta da entoação, do acesso ao tom de voz, às expressões faciais teriam levado a Tânia a uma interpretação exagerada das minhas intenções, que nunca foram ferir nem assumir-me como detentora exclusiva de bom senso. E havia mais: ela afirmava que "SEMPRE se questionara...", o que me fez pensar por que razão NUNCA mo dissera, em tantos anos de convivência próxima.
Teriam os meus pais razão quando afirmavam que os meus amigos andavam atrás de mim porque eu tinha carro e dinheiro e tudo em estado impecável para lhes emprestar, quando eles já tinham perdido ou estragado os seus pertences?
Eu começava a fraquejar. Sempre me opusera veementemente a esta visão dos meus pais sobre as minhas amizades, visão que eu queria que estivesse distorcida ou errada. Queria e lutava contra ela, quer ripostando, quer tentando ignorar o que queriam incutir-me: que só eles, meus pais, gostavam de mim a sério e, por isso, só eles estariam comigo numa ocasião de aflição, o que esperavam que nunca acontecesse, por muitas razões, entre as quais o facto de não vir a desiludir-me.
Ora eu, que, já havia meio ano, também convidara a Teres a visitar o meu blogue e ainda dela não recebera visita, nem agradecimento pelo convite, nem explicação da razão pela qual não aparecia por lá, comecei a cozinhar com vários ingredientes, entre os quais o facto de ela ser a irmã muito chegada da Rute, que se opunha claramente à minha forma de escrever. Senti, sobretudo, que os amigos verdadeiros até podem descompor-se, num gesto inflamado de desacordo, mas é isso mesmo que atesta a amizade. Achei que se a Teresa SEMPRE estranhou a minha paciência para me "abespinhar" com o que pouco importa, então devia ter-mo dito há muitos anos, ou mesmo logo na primeira vez que o sentira.
Eu estava a vacilar em termos de segurança relativamente aos meus amigos. E não me parecia que fosse a distância física imposta por mim oito anos antes, quando mudara de residência com a minha família, a responsável por alguma diminuição de amizade. Não era, de facto, essa a realidade que eu via. Começava era a duvidar da verdade da amizade, desde o início. Eu até nem nunca tinha passado por nenhum "momento de aflição" que a testasse... Via-me confrontada com a enorme dificuldade em comunicar com aquelas duas irmãs que considerei as minhas grandes amigas, desde a adolescência, e comecei a ser assaltada, aos quarenta e três anos, pelas vozes que os meus progenitores me tinham habituado a ouvir desde o tempo do liceu. E perante esta adversidade, tentei conversar, não com os meus pais, mas com elas.