sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

6. O Centro de Formação "Trevo de Quatro"

Num almoço de sábado, combinámos uma estratégia familiar para conseguirmos ter sempre dinheiro para passarmos as férias do Verão num local com praia e piscina. Deixaríamos de ter empregada doméstica e criaríamos o imaginário de pertencer a um centro de formação no qual os quatro filhos funcionariam como formandos e os pais como formadores, com vista à qualificação de todos para a pertença à equipa de seis que havia de ter sempre garantida a execução de todas as tarefas domésticas. Fariam parte do currículo de estudos várias acções e oficinas de formação, após as quais, se terminadas com êxito, os pais entregariam certificados onde estariam registados os créditos adquiridos. Os certificados de cada um seriam arquivados em dossiês individuais e os créditos serviriam para trocar por eventuais castigos merecidos por faltas de pouca ou média gravidade.
A ideia estava a agradar a todos e houve quem referisse que, assim, talvez o dinheiro até desse para fazermos mini-férias de vez em quando, por ocasião de feriados e pontes, por exemplo.
Por esta altura, a Maria tinha doze anos, o Quico tinha dez, e o Miguel e o Tiago tinham oito. E sentir a minha filharada pequena entusiasmada com a ideia de realizar trabalhos domésticos foi surpreendente e agradável. Pensámos então num nome para o nosso "Centro de Formação" e após muitas hipóteses a provocarem risota quase até ao disparate, houve consenso quanto a 'Trevo de Quatro' - a "escola" em que os quatro manos se formariam para serem excelentes donos de casa, o que viria a ser uma mais-valia para todos, quer no futuro próximo, quer num mais remoto. O nosso genro e as nossas noras, a existirem, não haviam de vir um dia pregar contra a educação ministrada aos seus companheiros pelos progenitores. Combinámos preferir oficinas a acções de formação, pelo que os créditos só eram atribuídos após a execução das tarefas individualmente ou em grupo, sem a ajuda dos pais. Tal aconteceria num segundo momento das oficinas, a realizar na semana seguinte à de cada sessão de transmissão de conhecimentos teórico-práticos.
As três primeiras oficinas receberam as seguintes designações: Perfeição na Limpeza do WC; A Arte de Dobrar T-shitrs em Poucos Segundos; e Introdução à Preparação de Uma Sopa.
No dia da limpeza do wc, tocaram à campainha por duas vezes. Da primeira vez era a Ritinha, de nove anos, vizinha da casa "granitada", que vinha pronta para a brincadeira após o almoço. E lá fui eu à porta para lhe explicar que entrar podia, mas não era para brincar. Se quisesse, ficava a assistir à exposição de todos os cuidados a ter, de todo o material necessário e de todos os procedimentos devidos a uma limpeza bem feita numa casa de banho. Eu e o Pedro já estávamos a começar a explicar e os seus amigos iriam ouvir e experimentar. A Ritinha disse que tinha de ir perguntar à mãe se podia ficar. E, enquanto foi e veio, eu só tive tempo de fechar a porta e subir as escadas. Logo tocou o Rafael à campainha. Agora era um dos manos da casa em frente, já com a bola nos pés, pronto para a jogatana no relvado. E já lá vinha a Rita, a dizer, pela rua fora, que ficava a ver a limpeza. Ao perceber que a Ritinha fora pedir à mãe, o Rafael considerou que devia fazer o mesmo. E assim ficaram as minhas vizinhas mães a saber que ia passar-se em minha casa um acontecimento extraordinário.
Formandos e formadores estiveram sempre dentro da casa de banho, enquanto a Ritinha e o Rafael assistiam do lado de fora. Nenhum deles tinha obrigações domésticas para além de fazer a cama, levar o lixo para os contentores e pouco mais. Mas, no tempo que ali passaram, até lhes pareceu divertido o trabalho e souberam responder a algumas perguntas no final. Os nossos conseguiram logo discutir na distribuição dos sanitários a limpar, mas tudo acabou em bem.
Na semana seguinte, depois de terem prestado provas em conjunto, demos a cada um dos filhos um certificado que atestava a aprovação na oficina e a aquisição de dois créditos. Aos vizinhos, oferecemos um atestado com um crédito, confirmando as suas presenças, algo que à mãe da Ritinha pareceu uma iniciativa interessante, mas à mãe do Rafael eu nunca soube se provocou alguma reacção.
A minha ideia estava a ter bom acolhimento por parte de quem me interessava, o que me entusiasmou para continuar, para contar às minhas colegas da escola o que andava a experimentar com os filhos e para dispensar a empregada doméstica. E, num belo dia, eu e o Pedro fizemos o quadro de registos do Campeonato de Arrumação dos Quartos. Estávamos a acabar 2007 e já conseguíamos controlar a miudagem, de modo a mantermos a casa arrumada e limpa.

5 comentários:

Laços e Rendas de Nós disse...

Vocês, por acaso, fazem acções de formação para vizinhos.

Estou a precisar, COM URGÊNCIA.

Beijo

Guida Palhota disse...

Olá, Acácia Rubra!
Podemos considerar essa tua necessidade, até porque os nossos filhos andam a precisar de reciclagem. Podemos juntar a miudagem mais chegada e chegar-lhes com alguns ensinamentos que os tornarão definitivamente mais atraentes!... LOL

Pedro disse...

Qualquer dia pode ser que enviemos a programação das oficinas de formação. É preciso estar atento às inscrições, aos seus prazos e ao número de vagas disponível. Em caso de de haver um nº de inscrições superior ao nº de vagas disponível teremos de ver quem está mais perto de subir de escalão pois aqui não há congelamento nas progressões!!!

2 beijos para as duas

Paula disse...

Não se esqueçam de que estamos no final do ano civil e se querem financiamento têm de entregar a papelada com urgência!!!!He he!
Tenho o previlégio de ser uma das colegas a quem esta história foi contada, em 1ª mão, logo após ter acontecido.E na altura pensei: estes pais têm cá umas ideias....
beijos aos formadores.

Guida Palhota disse...

Paulinha,

Que seria de mim sem ti?!
Nunca me iria lembrar de financiamento, mas agora já não me vou esquecer... Eheh! Vou já vestir o casaco e abalar para a Loja do Cidadão. Deve estar aberta a esta hora, ou não!?

Já passou tanto tempo...e tão depressa! A vida voa. E nós ou voamos com ela ou perdemo-nos de nós próprios e torna-se difícil reencontrarmo-nos connosco.

É bom ver-te por aqui. E noutros lugares também. LOL

Beijos